Decifre os números


Os informes financeiros são retratos fiéis da situação de uma companhia e podem indicar se vale a pena ou não investir nela

Os resultados financeiros das empresas são publicados periodicamente nos principais jornais do país e também nos sites das companhias. À primeira vista, parecem um emaranhado de números, mas são uma fotografia precisa de como a empresa está inserida no mercado em que atua e de qual é a sua situação financeira. Esses dados são importantes para que o investidor decida se vale ou não a pena comprar ações. Você não precisa analisar detalhadamente a demonstração contábil para tomar essa decisão. Basta ficar atento a alguns indicadores importantes. E isso está cada dia mais fácil. Como há um número crescente de pessoas físicas investindo em ações de empresas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), os balanços financeiros estão mais simples e didáticos. "Um balanço detalhado não assegura que a companhia vai ser rentável no futuro, mas é um bom indicador de como ela está hoje. Os resultados também servem para validar as projeções feitas em anos anteriores”, diz José Carneiro, sócio da área de auditoria da consultoria Deloitte, de São Paulo.

A cada três meses, as organizações costumam divulgar o seu balanço patrimonial, que mostra o quanto a empresa tem em caixa e qual é o valor de suas dívidas. Há também a demonstração de resultados, que evidencia como a companhia conseguiu seus lucros — e quanto entrou e saiu do caixa. No relatório de administração estão suas perspectivas, estratégias e os investimentos. Além disso, todos os balanços financeiros têm notas explicativas que trazem informações complementares, como, por exemplo, se a empresa está envolvida em ações trabalhistas. Além de olhar o resultado da própria organização em que você está interessado, vale compará-lo com o das concorrentes. “Se os números estiverem muito diferentes de outras do setor, há algum problema”, diz Marco Melo, chefe de pesquisa da Ágora Corretora, de São Paulo.

Para facilitar seu aprendizado na hora de ler um balanço, a você s/a pediu a analistas que apontassem os principais itens que um investidor precisa analisar nas demonstrações financeiras de uma grande companhia como a siderúrgica CSN. Confira.

ATIVO
Dentro do balanço patrimonial, o item chamado ativo mostra quais são os bens que a empresa possui. Há dois tipos de ativo. O ativo circulante reúne os valores que a compahia tem para receber no curto prazo, até um ano, e o dinheiro que já está no caixa. O ativo realizável a longo prazo é aquele dinheiro que a empresa vai receber a partir de um ano. Entra nessa conta, por exemplo, o valor de sua marca. Quanto maior forem os ativos, melhor. Eles indicam que a companhia tem dinheiro suficiente para honrar seus compromissos e também pode servir de garantia para empréstimos bancários.

PASSIVO
Nesta lista entram todas as dívidas da corporação. São as despesas com salários, contribuições sociais para o governo e adiantamentos de clientes. Os primeiros itens são aqueles com a maior chance de pagamento, como as dívidas com os fornecedores. Já os passivos não circulantes são aqueles que vão ser recebidos depois de um ano. “Se uma empresa promete dobrar a capacidade instalada e está extremamente endividada, é um sinal de que ela terá que fazer um financiamento para realizar esse investimento e a dívida vai aumentar ainda mais”, diz José Carneiro, da Deloitte, de São Paulo.

PATRIMÔNIO LÍQUIDO
O patrimônio líquido também está inserido no balanço patrimonial. Ele indica o dinheiro que os sócios ou acionistas colocaram na empresa. Na prática, é a soma de todos os ativos da companhia menos as suas dívidas. Se a instituição falir, é do patrimônio líquido que sairá o dinheiro para pagar os credores.

Você olhou todos os indicadores do balanço financeiro, mas ainda tem dúvidas se a empresa é realmente boa? Há duas contas que são feitas pelos analistas para avaliar uma companhia. A primeira é aferir o retorno sobre o patrimônio líquido, um indicador que mede a rentabilidade da companhia. A outra é verificar a relação entre a dívida líquida e o Ebitda, que vai refletir se a empresa tem dinheiro suficiente para pagar suas dívidas. Veja como esses cálculos são feitos:

Divida o lucro líquido pelo patrimônio líquido. Pegue o resultado e multiplique por cada real que pretende investir na companhia. Suponha que o resultado da divisão seja 0,49. Pegue esse valor e multiplique pelo valor que você tem na empresa: 10 reais, por exemplo. Neste caso, o investidor receberá 4,90 reais.

DÍVIDA LÍQUIDA E EBITDA
Esse indicador é uma bússola para descobrir a liquidez da empresa. No final do ano passado, a CSN possuía uma dívida líquida de 4,9 bilhões de reais, enquanto o Ebitda era de 4,87 bilhões de reais. Dividindo a dívida líquida pelo Ebitda, o resultado vai ser de 0,99, o que indica que é preciso menos de um ano para que a companhia pague a sua dívida. As agências que classificam o risco de empresas consideram como um sinal amarelo uma relação de duas vezes e meia do Ebitda em relação à dívida. “A relação da CSN indica boa capacidade de pagamento de dividendos, de compra de concorrentes ou de participação em outros negócios”, diz Marco Melo, chefe de pesquisa da Ágora Corretora, de São Paulo.

LUCRO OU PREJUÍZO LÍQUIDO
É a última linha da demonstração financeira, mas é a mais importante. O lucro ou prejuízo líquido é o dinheiro que sobra depois que a empresa vendeu seus produtos e pagou seus custos de produção e suas despesas. Parte do lucro líquido é reinvestido na companhia e a outra parte vai para os acionistas. Se o lucro não for para o acionista, ele vai para o patrimônio líquido. A CSN lucrou 2,9 bilhões de reais no ano passado, um valor 150% maior do que no ano anterior e o divendo pago ao acionista foi de 1,98 reais por ação.

LUCRO OPERACIONAL
Para o consultor José Carneiro, da Deloitte, de São Paulo, esses são os números mais importantes. Eles indicam quanto a companhia obteve apenas com o negócio em que ela está inserida. No caso da CSN, signifi ca quanto ela lucrou com a venda de aço. “É um resultado que a empresa tende a repetir no futuro porque mostra a tendência do negócio, já que não considera resultados extraordinários, como a venda de um bem ou um ganho financeiro”, diz.

LAJIDA OU EBITDA
O nome é feio, mas é importante que você se acostume com ele. Significa o lucro da empresa antes de ela pagar os juros que deve em negociações financeiras, os impostos, contabilizar a depreciação de suas máquinas e amortizar suas dívidas. Lajida é a sigla em português e o Ebitda é a abreviação do termo em inglês. CAPITAL DE GIRO
É todo o dinheiro que a empresa tem para comprar matérias-primas e para cobrir seus custos de produção. O valor dessa conta é formado pelo dinheiro que está no caixa, pelos estoques e pelas contas que a companhia vai receber. Os sócios, por meio do capital próprio ou de lucros acumulados, bancos e fornecedores também podem ajudar a formar o capital de giro.

DIVIDENDO
É uma parte do lucro pago pelas empresas a quem possui suas ações. A lei determina que no mínimo 25% do lucro líquido do ano seja distribuído aos acionistas, mas é a empresa que escolhe em que data vai pagar. Se você tem 100 ações de uma companhia que promete pagar 50 centavos de real para cada ação todo mês, vai embolsar 50 reais, independentemente do valor do papel na bolsa.

Os Números Podem Mentir
Os resultados financeiros são auditados por consultorias especializadas para evitar que os dados sejam fraudados. Mesmo assim, algumas companhias conseguem maquiar seus resultados. A Enron, gigante americana do setor de energia, pediu concordata em 2001 depois de ter sido denunciada por fraudes contábeis e fiscais. A empresa conseguiu esconder uma dívida de 25 bilhões de dólares e aumentar seu lucro nos balanços. Segundo Marco Melo, chefe de pesquisa da Ágora Corretora, de São Paulo, uma maneira típica de maquiar um resultado de uma companhia com liquidez ruim é fazer um empréstimo no final do ano. O dinheiro deixa a empresa mais capitalizada. Para José Carneiro, sócio da área de auditoria da Deloitte, de São Paulo, algumas empresas podem deixar de atualizar suas dívidas, o que as deixa menor ao longo do tempo. Não é fácil identificar essas alterações, por isso é importante conhecer a idoneidade dos gestores da companhia.